NACIONAL ENERGY

terça-feira, 5 de novembro de 2024

SOBRE A PALAVRA VIOLENTA - CRÔNICA

        E saiu... como se eu sequer tivesse pensado em dizer. Xinguei.

Saiu naturalmente como se nem fosse eu quem a teria dito. Porém, meus ouvidos denunciavam contra a minha boca. Meus ouvidos permaneciam não enganados diante do que minha mente queria. Queria negar o que dos lábios saiu.

Sim, saiu. E senti por segundos como se eu não fosse aquela pessoa. Por outro lado, alguém dentro de mim quis afirmar o próprio erro. Quis sustentar o fracasso em forma de singelo palavrão: “Essa porra!”; como se fracasso não fosse.

Que turbilhão, passado em segundos. Em um ou dois minutos, que seguiram, parecia que aquilo sequer houvesse existido. Era semelhante a um apagamento involuntário que a mente impunha convenientemente a si.

Contudo, é de pasmar! Não havia ambiente para aquilo. Estava muito longe de haver forças ou motivos suficientes para que alguém sucumbisse a dizer algum nome feio. E, talvez, por se analisar a incipiência de motivos presentes nessas circunstâncias e a tamanha absurdidade contida no meu erro, agora, posso revisitar aquele meu abismo momentâneo e minutal.

Afinal, o que me aconteceu?

Teria eu explodido por motivos em acumulado? Razões de outras temporalidades? De outras assujeitalidades? Quem sabe... estava distante de muitos momentos que me motivariam mais substancialmente a proferir impropérios? Só que o tempo do relógio não é como o tempo que constitui a natureza da memória e a dos sentimentos. E sigo. Teria me acometido um lapso de insensatez diante do não mensurar as forças reais da cena loco-temporal?

Eu sempre falo da intransigência das pessoas. Só que a minha, ali, estava tácita. Quase querendo-se virtuosa. Como pude? Ou quem pode? No entanto, assim fazemos.

Ainda preciso me apegar a um pouco mais de crédito e tolerância para comigo mesmo. Pois, tendo neste instante uma medida mais fiel do que foram as coisas e das coisas que me aconteceram, enxergo que as pessoas que foram alvo e pivô, o estopim, da minha palavra violenta não necessariamente se comportam virtuosamente. Pelo contrário, não poucas vezes já mereceram justos impropérios. Mas, por questões de escolha pessoal, fé, filosofia de vida e compromisso profissional, eu não jamais justificaria a minha conduta de ter xingado.

É verdade! Não xinguei as pessoas. Talvez, por certa pressa e precipitação, ficou aqui algo parecido com isso: o Anderson xingou direta e injustamente uma ou mais pessoas. Contudo, não foi nada disso. Minha fala foi a algo não orgânico, foi endereçada a algo não-pessoa, foi dita um elemento físico, material e prático. Enfim, eu disse: “Para de conversar bobagem e faz a porra dessa atividade!”. E com cara fechada. Ou seja, parecia bem sério. E com raiva.

Em síntese, é! Foi tudo isso sim. E não consigo recordar em nenhum momento da minha história em que sequer tivesse eu passado perto disso.

 

terça-feira, 15 de outubro de 2024

PROFISSÃO DE FÉ - POEMA

PROFISSÃO DE FÉ

À minha frente, o futuro... alunos.
Atrás, o quadro... vida e conhecimento. 
Por dentro de mim, a fé... os estudos.
Sob os pés, a base... profissão e compartilhamento.

Na diagonal, os desafios... provas, exames e muros.
A queda, mais um ano... atrasos e lamento. 
Mas do alto, um olhar... esperanças e absurdos
Dizendo: siga em frente... um novo tempo.

De um lado, mil... sem preparos. 
À direita, dez mil... multidão do desatento.
A voz inclina, proferindo... aulas e pontos. 

O novo dia veio, atravessado... "margento".
O ontem passou, chorado... beirando sustentos. 
Porém, valeu a dor... o céu estrelado e bento.


quarta-feira, 9 de outubro de 2024

AS CAMADAS DA MENTIRA - CRÔNICA

      Para se observar as camadas da mentira existe uma questão elementar e inevitável. A mentira. Que ela aconteça!

É importante que o erro a ser escondido, que não é escondido de todos, já tenha sido cometido. É necessário que a vergonha que pode ser causada já tenha motivo consumado. Só é possível quando a dor que pode ser sentida já tenha se tornado sentida imaginosamente: contando com os atores que não podem saber da verdade sabendo-a. É crucial que o pecado, o delito em alguma escala da vilania, tome corpo, matéria e forma.

Vencida essa etapa, podemos, então, identificar a geologia da mentira, as eras em que ela se instala. Podemos localizar todas as camadas que o tronco do mal conseguiu arvorar, vasificando sua seiva bruta. Quem sabem possamos discernir, inda que por espelhos, alguma nítida luz, atravessando as brechas do inexplicável natural.

 Há a camada do querer falar a verdade. Há a camada do seguir mentindo para si. Há a camada do acreditar que é melhor mentir para os outros. E, por fim, há a camada de fora, isto é, a não-camada, a liberdade, definida enquanto a retirância de cima de si de todo o julgo-que-não-é-suave e do fardo-que-não-é-leve.

Na camada do querer falar a verdade, você está diante da pessoa sobre quem e a quem você acredita ser melhor mentir. A verdade caminha até tua mente, pula nos teus olhos e ganha feições nos traços da tua face, porém, ela enreda-se pela língua e salta fisicamente em ondas "amorais", sonorando a falsidade. Leve, indolor e conforme o script.

Na camada do seguir mentindo pra si...

Nunca conhecemos sua fundura n´alma. Seria a resposta mais simples e honesta. 

Não sabemos o quanto desse poço em secura pode prejudicar. A si e aos outros. Mas, sigamos com o a si. Sequer imaginamos que seja um abismo chamando outro abismo. É nessa camada que a verdade permanece desconhecida de nós mesmos. Nós nos tornamos desconhecedores de quem somos perante nosso próprio espelho interior.

E, na camada mais covarde da mentira, nela, habita o mal. Nela, a crença que apaga qualquer sentido da vida do outro em nós. Anula e desumaniza. Apaga o Espírito Santo e nos descristianiza. Nela, o senso de toda uma existência dual alquimiza-se em vazio. Isso nos faz questionar de que matéria é construída a dura camada, que dá corpo, que constrói – destruindo-nos – a camada do seguir crendo que mentir às outras pessoas é melhor.

Por fim, há a que devia só haver. Há a em que muitos vivem sem ha(v)er.

Há a camada que, por ora, e por anais, muita gente questiona, filosofa, discrepa... 

O lado de fora.

domingo, 6 de outubro de 2024

CULTIVE SEU NARCISISMO - CRÔNICA

Cultive certo narcisismo, um peculiar narcisismo. Pois você não sabe até que ponto as pessoas vão querer te usar, caso você não se sinta melhor do que elas.

Não abandone por completo Teu egoísmo, porque você não imagina o quanto de gente vai te chamar de desumilde, se você não fizer, exatamente, aquilo que elas querem.

Tenha sabedoria para travar uma batalha com o teu próprio ego. Isto é, todas as pessoas sábias batalham com e contra o próprio ego. Isto é inescapável. Mas nem sempre o ego dos outros vai usar de sabedoria para julgar o teu.   

Mantenha uma quantidade de personalismos, já que tentar agradar a todos é uma maneira muito triste de não honrar quem você é, jogando fora tua identidade própria.

Não jogue fora o rei que você tem em teu umbigo, já que as chances de te chamarem de pessoa sem qualidade nenhuma, vazia, também é uma das consequências de quem se sacrifica pelos outros e por todo mundo. Pois, no meio do todo mundo, que recebeu teu sacrifício, também tem gente que vai te chamar assim.

Nem sempre é ruim se sentir a última bolacha do pacote. Saiba que muita gente vai avaliar você como quem não dá valor nenhum a si mesmo. Seria muito bom te pegarem num dia desses de bolachinha preciosa.

Não arrisque anular teu orgulho próprio. Ainda que você pense não ser melhor nem pior do que ninguém, lute para nunca ser o pior nem continuar tendo a mesma quantidade de amor próprio que ontem.

Ame-se mais!

Neste mundo, há um intercâmbio obscuro de signos e espelhos da alma. Não há garantia nenhuma de que o bom senso, seja o dos olhos que te denunciam, seja o dos olhos que se autojulgam, tenha sido bem desenvolvido.

Talvez, muita fração do bem que as pessoas julgam ver em si mesmas, elas mesmas reputam ser o mal que elas enxergam na vida do próximo.

E vice-versa!

Enfim, cuide para que a luz há em ti não sejam trevas. E tenha muito mais cuidado ainda para que não sejam tão grandes tais trevas.   

sábado, 14 de setembro de 2024

LUTANDO PELO O QUE NÃO DURA - CRÔNICA


Anderson Damasceno

Em quantas brigas inférteis eu já me meti? E em quantas delas o motivo, que eu julgava ser o certo, não o era? A energia que eu acreditava valer a pena aplicar não valia. E todo o tempo, que eu sequer me importava em gastar, esse, sim, valia. Porém, todas as brigas foram trocadas por um grande e abstrato nada.

Pior, tudo foi transmutado pela memória do inacabado.

Algumas das improdutivas lutas duraram pouco. Outras duraram anos. E, no final das contas, a conta e os juros da infertilidade só inflacionaram. Muita coisa boa foi abortada. Anos de devoção errada não vingaram. E o coração que pulsava soube que seus pulsos não bombearam nada.

Talvez, vai, bombearam um sangue sisificado... e as pedras erguidas, ou roladas pelos punhos de seu dono, construíram no máximo a mente de sua jornada. Uma mente de travessia. Uma mente em lemniscata.

Bora lá!

Primeiramente, tirar esse tipo lição para continuar vivendo, com sobriedade, a vida, olha, não é nada fácil. Conviver com a autopercepção de que se investiu muito alto num vazio de nada é perturbador. É insonificante!

Foi aos 35 anos, depois dos anos 2020, eu acho, que pude ter algumas experiências com o pânico, com picos de ansiedade e com a perda de sono. Três coisas cujas existências nunca foram empíricas para mim. Ocupavam não a memória do inacabado, mas, quem sabe, alguma parte pequena do Ser. Não nesse grau angustiante, de agora, “e de por anos”, que me fazem olhar minhas mãos improdutivas.

E olha que já perdi sono nos corujões de CS da juventude. Melhor, nas vigílias de fé para uma nova juventude. E ambas não foram improfícuas. Houve boa colheita.

Contudo, esses episódios acontecidos de lá pra cá, possivelmente, só estariam coroando toda a minha violenta infertilidade de briguento. Acredito que estou disposto a admitir isso.

Nem toda briga é justa. Nem todo sacrifício é certo. Vou fazer o esforço de recordar algumas das vezes que lutei por coisas de baixo valor. Confesso que farei um tipo de esforço de quem foge. O tipo de esforço em que se enxerga o mal e se conhece o mal, só que não consegue sobre ele falar. Não consigo detalhar sua face que, por agora, já tem até um pouco das rugas que encontro na minha. Mas estou de uma distância de segurança em que posso fitar.

Sempre há um mal que a gente quer esconder antes que outros o enxerguem como nos os enxergamos. Quem sabe, o medo mesmo seja o de sermos pegos olhando para o nosso próprio mal improdutivo, pois, nesse exato momento, dos que nos olham, muitos podem saber que a gente já se sabia.

É bom encarar o mal. Do mesmo modo que é bom refletir.

E, quem sabe, vou descobrir um dia que as quantas brigas inférteis ao menos puderam me dar um bom e grande nada, para que eu possa carregar, consciente, de que as perdas e os não resultados, que sisificaram, não puderam impedir as novas brigas.

Quando eu falo “brigas” posso estar me referindo a pessoas, a projetos, a sonhos que se criam certos. Sonhos em que eu os cria bons.

E... olha só! Recordei confessando pelo menos duas lutas de improdutividades. Numa, fujo. Noutra, espero que vocês nunca me vejam enquanto estou olhando para mim.