Anderson Damasceno
THE GREAT RESET versus THE GREAT START
O foco do livro Conservadorismo: um convite à grande
tradição, do filósofo britânico Roger Scruton (1944 – 2020), tem a ver com
a “filosofia política” e não com a “prática política, que atraiu o rótulo de
‘conservadora’”[1].
Nem tudo aquilo que possui um rótulo apresenta, de fato, o conteúdo esperado,
condizente ao rótulo. Nem todo mundo que se diz conservador é. Talvez seja só
um “conversador” pagando de conservador, o típico aproveitador do hype
discursivo do momento.
É importante frisar isso, pois há
demagogos e aproveitadores em qualquer espectro político: centro, direita ou
esquerda. A eleição de Bolsonaro, em 2018, mostrou que Witzel, Doria, Frota e
Hasselmann são exemplos disso na Direita. Conversadores,
gente de bom papo furado, demagogos de direita. Portanto, o abismo ou a
estreiteza que possa existir entre “filosofia” e “prática” é uma questão de
ética, de fé pessoal. O abismo ou a estreiteza depende mais das pessoas – e
suas consciências – do que de suas ideologias propriamente ditas. E claro,
discordando do Veríssimo, a culpa do abismo ético entre filosofia e prática não
é da água.
Contudo, temos que fazer uma
ressalva. Longa! De certa forma, no Brasil do século 21, quem cultivou esse
abismo foram as esquerdas.
A fama abismal de corrupção está
no colo da esquerda. A demagogia esquerdista, o duplipensamento progressista e
a mentalidade das lideranças máximas do PT/(P)MDB, durante os governos Lula e
Dilma/Temer (2002-2018), sem sombra de dúvidas, são responsáveis pelo rótulo de
abismo ético na política. Essa gente definitivamente relativizou a corrupção.
Até o Obama (2020) lançou livro reconhecendo em Lula características de
mafioso. Em outras palavras, a percepção da realidade em que a “Esquerda Caviar”
seja corrupta se culturalizou no país. Agora, aguentem o ranço! Ou, façam o mea culpa para ser o start da expurgação.
Scruton afirma, ainda no prefácio
da obra citada, que “Ser conservador é uma maneira distinta de ser humano, e em
todas as esferas da vida o temperamento conservador se afirmou: arte, música,
literatura, ciência e religião” e que seu objetivo é “mostrar a coerência da
visão conservadora e como ela pode ser defendida”.
Talvez seja essa amplitude do
temperamento conservador que, muita vez, gera uns desconfortos. Pode até
parecer estranho, mas, embora exista um consenso entre nós, pensadores
conservadores, de que os ideólogos frankfurtianos tenham criado os instrumentos
atuais para o recente “sucesso” da esquerda global, para o projeto de poder dos
progressistas em escala global, a crítica de Theodor Adorno no campo da música é
interpretada por muitos estudiosos como uma crítica conservadora.
Adorno conservador!!! Alguém
explica?! Quem sabe numa próxima.
No Brasil, muita gente já deve
ter ouvido o professor Olavo de Carvalho (OdC) ou a deputada estadual
catarinense Ana Caroline Campagnolo dizendo que conservadorismo não é uma
ideologia ou filosofia, mas algo como o melhor ajuste natural das coisas, algo
de natureza instintiva e até antropológica. O filósofo britânico também destaca
que a atitude conservadora é instintiva. Só que, na filosofia política,
conservadorismo “é um fenômeno recente, surgido durante o curso de três grandes
revoluções – a Revolução Gloriosa de 1688, a Revolução Americana que terminou
em 1783 e a Revolução Francesa de 1789”.
Vale mencionar, a título de
informação, que no texto “A revolução globalista”, de setembro de 2009, há uma
análise perspicaz do professor OdC criticando o fato de se usar o rótulo de
“revolução” para o que ocorreu nos Estados Unidos da América, no sentido de se distinguir
do que teve ocorrência na França. Por exemplo, a postura dos pais fundadores é
bem distinta da sede por sangue vista naqueles que destituíram o Ancien Régime.
E, pra aproveitar a tabela, meu poema “No dia da votação” segue semelhante
reflexão acerca dos idos de 1789.
Retomando Scruton, é necessário
entender o contexto dessas “revoluções” que marcaram todos os movimentos
conservadores vindouros, além de explicar porque é no mundo de língua inglesa
que a palavra conservador é usada para identificar os políticos, seus partidos
e aquilo que defendem, pois “em outros cantos do mundo, o termo é mais
frequentemente um insulto”.
Em 2005, eu entrei na graduação
em Letras, na UFPA campus de Marabá – atual campus 1 da UNIFESSPA –, e o termo
conservador já era insulto bem presente no dia da angústia. E assim seguiu. A
universidade não evoluiu na mentalidade e no respeito como evoluiu na amplitude
de seus 3 campi. A universidade pouco congrega os universos de pensamento
existentes. A bolha cognitiva ainda impera, e a hegemonia do pensamento
progressista ainda é um muro de Berlim ofendendo as liberdades humanas e
científicas.
E como provar isso? É tão
horrivelmente fácil. Está em uma palavra. O silêncio. Nesses anos todos, nunca
houve um cartaz de debate ou evento tratando de temas por uma ótica de autores
conservadores. Exceto alguns encontros feitos pela Aliança Bíblica
Universitária (ABU), que é ainda tímida e de pouca envergadura nas universidades
de marabá.
Na verdade, nos cursos de
humanidades e linguagens dentro da universidade se o estudante não for
pesquisar, dificilmente receberá estímulo de qualquer professor(a) para estudar
ou descobrir pelo menos um único autor(a) fora da bolha cognitiva da esquerda.
O curso de direito participa inflexivelmente da mesma bolha. Tanto faz ir em um
único evento quanto em dez, seminário, congresso, palestra. Sente-se o ativismo
jurídico de cunho progressista de forma hegemônica. Basta ver o silêncio e a
ausência do pensamento conservador em TCCs ou artigos, produzidos por esses
alunos no campo do direito em temas como drogas, aborto, armamento, casamento e
direito familiar. Se evocado, é para ser depreciado e rechaçado.
Aliás, não me espanta mais ver
que esse ativismo está infiltrado até o tutano de muitos universitários que até
negam ser de esquerda. O gramscismo sorri. O discurso dos docentes e discentes
que ousam se colocar e se imposturar politicamente atacam os pilares do
conservadorismo que são abordados nesta obra de Scruton.
Saí em 2020 do mestrado na
UNIFESSPA e a palavra conservador continua sendo um insulto, um estigma.
Facilmente qualquer calouro ficaria inibido em se apresentar como tal. Se for
conservador e evangélico então, está danado como as filhas Dânao. Nos três campi
de Marabá, principalmente no I, a tentativa de inibir qualquer universitário
conservador é algo extremamente cotidiano. Um status quo covarde está instalado ali. O pacto da mediocridade e do
preconceito sustenta o silenciamento. E muita gente finge não ver isso.
Talvez, o fato mais engraçado do
que ver os professores universitários com adesivos petistas em anos de eleição
presidencial, transformando suas aulas, suas salas de aula, seus grupos de
estudos e seus corpos como outdoor, é quando acontece um “debate”. Quando há
temas polêmicos para discussão com a sociedade acadêmica, os colegiados e
institutos de cada curso espalham cartazes com o nome “debate tal”, todavia, o
que fornecem ao público é “palestra” do clubinho de mentes progressistas. A
garotada caloura e os veteranos estocolmizados lotam o auditório José Ribamar
para ver um mediador, dirigindo uma discussão entre dois progressistas. Não há
divergência no palco. Caso aconteça de ir só um especialista ou doutor, isso
faz com que o mediador vire entrevistador.
Tudo isso acontece até hoje e
ninguém fala absolutamente nada. E não é só em Marabá!
Obviamente, convivi no seio da
universidade com inúmeros professores que respeitavam os alunos que pensam
diferentemente deles. E levo esse exemplo de respeito e profissionalismo para a
vida. Minha crítica, é OBÓVIO, está
endereçada ao espaço institucional, que embora tenha a função de ser técnico,
isonômico e pragmático, sustenta esse status
quo que estigmatiza o termo conservador e as pessoas dentro da universidade.
A postura da instituição UNIFESSPA ainda permite que o espaço social se mantenha
hegemonicamente desconfortante e, não poucas vezes, hostil para universitários
conversadores. Não falo de tortura física, coisa que também pode acontecer nas ditas
“assembleias” no tapiri ou nas festinhas para arrecadar fundos para formatura,
falo da tortura ocasionada pela submissão ideológica, submissão linguística e
submissão comportamental. É uma dor que vai na alma quando fica nítido que na
sala tem um grupo de estudantes, com aval do professor, que se sentem ungidos
revolucionários, e vão reformular o mundo com a empáfia suprema de Barrosos e
Fachins.
Apesar desse cenário desotimista
em nossa terra relicária e graciosa, no torrão paraense, o Conservadorismo tem
sido uma força real na Europa continental, tanto quanto na anglosfera,
inclusive com pensadores da França, Áustria, Alemanha e Espanha, provando que
nos tempos modernos, como diz o filósofo britânico, há uma forte envergadura e
complexidade na tradição intelectual conservadora.
O papo é sobre política, mas o
conservadorismo tem força intelectual e espiritual expressiva na arte, na
música, na literatura. Scruton, inclusive, recorda que a primeira grande obra
de Edmund Burke foi um tratado sobre o sublime e o belo, os Cursos de estética de Hegel. Em verso e
prosa, por exemplo, há ainda Chateaubriand, Coleridge, Ruskin e Rilke. Material
que Scruton trabalha em livros como Beleza
e O Rosto de Deus.
Este texto representa a abertura
de um conjunto de aulas que estou elaborando sobre Conservadorismo, destinadas tanto
aos encontros on-line de estudo quanto ao presencial: Encontro de Profissionais
Conservadores de Marabá (EPCOM). Quem quiser compartilhar sugestões de livros
ou palestras sobre o assunto, pode deixar nos comentários. Simbora!
[1] SCRUTON, Roger. Conservadorismo: um
convite à grande tradição. 1ª ed. Rio de Janeiro: Record, 2019. p. 7.
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