Processos demoram anos mesmo para pessoas com deficiência, que são asseguradas pela lei da prioridade. |
Há mais de 830 dias, se arrasta no Poder Judiciário o
processo promovido por Nacélio Souza Madeiro, universitário de 31 anos, que
exige reparos por danos morais provocados pelo Banco Fibra. Mesmo sendo
assegurado pela lei 12.008, que confere a ele prioridade no atendimento por ser
deficiente visual, a ação tramita a passos lentos na 2ª Vara do Juizado Especial
Cível de Marabá, que fica no Fórum Juiz José Elias Monteiro Lopes, situado no
Bairro Amapá.
Em novembro de 2013, o estudante de Ciências Sociais na
Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (UNIFESSPA), entrou com processo porque
pagou fatura do cartão de crédito, mas o Banco Fibra alegou não recebimento e
negativou o nome dele no SERASA. O pagamento foi provado e a empresa financeira
perdeu a causa, mas nunca houve a reparação.
Segundo Nacélio Madeiro, logo em abril de 2014 o juiz de
direito, César Dias de França Lins, decretou que o banco teria que pagar uma
quantia de R$ 5.000,00 em indenização.
“Tive duas audiências, sendo que numa de 2014 a outra parte
não compareceu. Já em abril de 2015, ambas partes compareceram. Porém, estou
muito insatisfeito porque meu processo está para ser sentenciado até hoje. Toda
vez que vou até o Fórum, eles pedem para aguardar mais dias, ou dizem que mudou
o juiz. O que é certo é que a minha prioridade já completou dois anos de
espera. Assim não dá”, afirmou.
Madeiro recorreu à Imprensa, enviando carta ao Jornal Opinião, pois considera que está
sendo alvo de descaso e morosidade por parte do Poder Judiciário em Marabá.
A reportagem foi ao Fórum, na terça-feira última (16), a fim
de averiguar o porquê dessa situação seguir indefinidamente.
Pelo exposto nos documentos da 2ª Vara, Nacélio é vítima de
uma crise estrutural, que deixa o Judiciário de joelhos, sendo a falta de
juízes sua principal causa.
De acordo com Nádia Alice, diretora de secretaria, para se
ter uma ideia, com o passar do tempo há um acúmulo de 5 mil processos em
andamento – 8 mil, na verdade, se forem somados com os da 1ª Vara.
“Desde junho de 2015, por exemplo, a 2ª Vara do Juizado
Especial estava sem juiz titular. Não tinha ninguém para trabalhar os processos
e ainda não tem. Muito menos servidores e técnicos o suficiente”, enfatiza.
Ainda de acordo com Nádia Alice, no meio desses milhares de
ações tramitando em Marabá, há casos de pessoas que vieram do Pacajá para
resolver, muitos são amparados pela lei da prioridade, que vão continuar
sofrendo, haja vista que existe um conjunto de problemas gerando a demora.
“Há processos de 2011, que são com prioridade, mas nunca
foram resolvidos. As pessoas estão aí aguardando sentença. Nós, servidores,
também estamos acumulando funções, pois aqui só existem dois funcionários, para
fazer ofício, interagir com o Ministério Público, ficar no atendimento”,
observa.
A reportagem não pode ser atendida pela juíza, Adriana
Divina da Costa Tristão, que está à frente da 2ª Vara, desde janeiro de 2016.
Também com ela estaria o processo de Nacélio Madeiro, apenas aguardando nova
sentença.
ENTENDA O CASO DE NACÉLIO MADEIRO
Há episódios na crise estrutural
do Poder Judiciário semelhantes às novelas trágicas, que podem ser vistos na
caminhada do reclamante Nacélio Madeiro. O caso dele se torna emblemático por
representar milhares de portadores de necessidades especiais.
Em primeiro lugar, por não ter condição de pagar os
honorários advocatícios, ele iniciou o processo pelo sistema Projudi (Processo
Judicial Digital) para poder agendar um defensor público que acompanhasse o
caso dele. E são poucos. Por consequência, o jovem deficiente sofre na pele a
qualidade do serviço.
“Sei que eles ganham muito bem para atender a gente. Mas, por
mais que eu procure o meu defensor público, o José Erickson Rodrigues, nunca
trocamos uma palavra. Nem uma ligação ele dá”, pontua Madeiro.
Segundo, a sentença favorável do juiz César Lins foi anulada
pela juíza relatora em Belém, Márcia Cristina Leão Murrieta. Em dezembro de
2014, ela aceitou recurso do Banco Fibra tão somente porque o endereço deste
não foi citado nos autos.
“Entendo que os atos processuais praticados após a citação
inválida do recorrente (Banco Fibra) devem ser anulados, razão pela qual
determino o retorno dos autos à Vara de origem para regular processamento da
ação, (...) devendo, ainda, ser designada nova audiência”, diz a sentença de
Márcia Murrieta, em documento pelo órgão Turma Recursal Permanente Exclusiva
dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do Pará.
Com isso, a ação de Nacélio Madeira foi retomada com as
correções exigidas pela relatora de Belém. E agora, a indenização que o Banco
Fibra deve pagar é de R$ 13.560,00 uma vez que o juiz César Lins, novamente,
esteve em audiência com as partes, em abril de 2015, e não houve reconciliação.
Tal situação revela um vício no Judiciário, pois, ser houver
mais um “deslize” ou “errinho”, o processo do universitário pode, novamente,
ser anulado e ter que voltar para origem. Mesmo o fato principal já foi comprovado.
Isto é, ele nunca ficou devendo o Banco Fibra.
Por fim, o fato dos juízes terem que revezar no
acompanhamento dos casos, demorando anos para sentenciar, faz a crise
estrutural ser monumental também. Só o de Nacélio Madeiro já passou pelas mãos
de três doutores, César Dias de França Lins, Daniel Gomes Filho e Adriana
Divina da Costa Tristão, uma situação que já o fez pensar em desistir várias
vezes de lutar contra a injustiça que sofreu.
Vale lembrar que o Tribunal de Justiça do Pará,
recentemente, chamou 41 novos juízes para, futuramente, atuarem nas comarcas do
estado. Espera-se que Marabá viva um pouco deste futuro.
Nenhum comentário:
Postar um comentário