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domingo, 14 de maio de 2017

POEMA - Mães de Marabá (Anderson Damasceno)

Mães de Marabá (POESIA POLITICAMENTE INCORRETA) - Anderson Damasceno*

Para dona Nira, mãe de Anderson e Andressa e Tiago

Marabá é uma mãe,
Que matou seu filho,
Coisa amarga de lembrar.
Mas, quem sabe, com poesia,
Dá pra dessa história falar,
E a todas as mães homenagear.

Marabá é a história da índia,
Que Gonçalves Dias fez consagrar,
Grávida de homem de branco,
A cria, sua tribo não pôde aceitar.
Se o pai abortou, ela ouviu velho conselho:
“Seria melhor vivo o enterrar”.

Ninguém aceitava a mistura,
Nem do lado de lá, nem do lado de cá.
Índio só queria natureza pura,
E português odiaria se “rebaixar”.
Já que é essa a história, digo:
“Tem hora que não dá pra acreditar”.

Já que os dois fizeram um filho,
Assumir era o mínimo a se esperar.
Ela mãe, ele pai, e Marabá filho,
Suas purezas que ficassem pra lá.
A família natural é o maior bem,
Nem lei ou ideologia a podem acabar.

Sei que em algum lugar,
A natureza havia de reclamar,
Se os pais não assumem,
Algum resultado isso há de dar.
Mas deixo essa parte pra depois,
Existem polêmicas antes pra apreciar.

Culpam sempre o homem branco,
E isso é preciso recordar.
A ele é dada a cultura de violentador,
Veio aqui só pra explorar,
Só pra impingir terror
E mandar todo mundo se lascar.

Só que quem tem mente livre, de vero,
Consegue lançar mais de um olhar,
Enxerga que no passado marabaense,
O brasileiro também está.
Índio também matava imigos,
Muito antes das naus aqui chegar.

Disso fala Darcy Ribeiro,
O homem d’O povo brasileiro,
Dou página, parágrafo, e sublinhedo
Essa rima tive que forçar,
Mas posso até emprestar,
E que os mimizentos chorem por lá.

Suas culturas “eram” guerreiras,
Também faziam guerras estrangeiras,
Mesmo que seus semelhantes,
Com arco e flecha, porretes maçantes,
Mal sabiam o cavalo usar.
Bicho ainda não domesticado,
As ONGs de hoje não gritariam: “Irados”.
E já que o verso é meu, posso mais um esticar.

Marabá também é a filha,
Mulher de mistura e híbrida,
Sobrevivente daquele conselho velho,
E imortalizada em românticos versos.
Nela, Francisco Coelho viu candura,
Apesar da imagem cruel da literatura.

Não aceita, nem por lá, nem por cá,
Nem por pai, nem por mãe,
Nem por branco, nem por índio.
Ela sente falta de um mimo,
E pensa que nos homens pode encontrar.
“Mas, tu és Marabá!”

Ao se olhar no espelho d’água,
Vendo em duas metades a própria cara,
A percepção que tem de si é rara.
Mesmo com a beleza de dois povos,
O seu coração é todo oco,
Não recebe amor de um nem de outro.

Lá não havia ninguém para pregar:
“Você num piciza de homi, mulé,
Ramo lá! Deixa de ser besta, siá.
Tia Bey disse que vamos esse mundo dominar”.
E se alguém cantar que é pra o exemplo de Atenas mirar,
Logo, logo, Belchior vai encontrar.
Acho que dá pra deixar aqui um KKK,
E mais uma vez os meus versos esticar,
Assim os nazi-mortadelas podem ao Ku Klux Klan me relacionar.

E agora, depois de tanto texto,
E dessa esticada poesia,
Ainda sobra alguma beleza,
Que não seja só cinismo e ironia?
Será que dá pra elogiar as mães,
Todas que tem ou não o nome Maria?

Há sim muitas histórias,
E é preciso que eu as diga.
Aqui também há memórias,
De Severinos e Zacarias,
De Luandinos e Mia Coutos,
De muitas mães e de índias.

Gente que encontra alegria,
Hoje adulto, lembrando da infância,
Correndo nas ruas da Antônio Vilhena, ou da Boa Esperança.
Quem sabe correndo na Folha 16,
Ladeiras e ladeiras, esta é a minha infância.
Por lá tinha uma peixaria... Teixeira? infância...

Marabá é tão plural,
O bom disso é que não existe
A preocupação de se chegar ao final.
Quem dirá, então, chegar a seu começo?
Mesmo que eu o tenha feito neste poema,
De qualquer lugar você pode começar sua cena.

Esta cidade começa em qualquer lugar,
Basta que haja uma mãe,
A sorrir, a chorar,
Acompanhada ou solitária.
Existem mães na beira da estrada,
E outras que hoje não voltaram pra casa.

Quem delas hoje terá sequer um,
Um filho só para a congratular,
Ao menos uma filha pra abraçar e presentear.
Não me custa acreditar que a maioria delas,
Fez de tudo pra ver sua criança brincar,
Correu na ladeira, ou foi atrás de “retrato tirar.”

Coisa dura é dar um filho,
Por ser pobre não criar,
Passando fome e frio, apesar de amar.
Pior ainda é o matar,
Pois a natureza de um aborto,
Pode ser tudo, menos amar.

Só que agora me demoro
Naquelas que vim louvar,
Mães de toda minha cidade,
Minha linda Marabá.
Foi aqui que eu nasci,
É onde pude me criar.

Filho de mãe solteira,
Filho de mulher acima das guerreiras,
Pode passar a sorte de uma vida inteira,
O melhor presente foi dela eu principiar.
Deus gracioso, Deus divino, mesmo 
Sem eu pedir, Ele soube me abençoar.

A vida dela se confunde,
Não é difícil de se igualar,
A tantas mães que padeceram
Para poder seus filhos criar.
Abdicou de sonhos, passou fome,
Mas conseguiu nos fazer amar.

Sua história não cabe nesse poema,
Isso também devo falar,
E sem tem um coisa,
Da qual sempre vou me orgulhar,
É que se hoje tenho honra de homem,
Graças as suas lições, continuarei a lutar.



*Anderson Damasceno Brito Miranda é natural de Marabá, Pará, nascido a 8 de julho de 1985. Mas, residiu por longos anos em outros municípios do estado como Altamira e Goianésia do Pará. Retornou para a cidade natal em 2004, onde passou a morar, novamente, com a família. Aos 19 anos, fez confissão de fé em Cristo. Em 2005, ingressou para o curso de Letras na Universidade Federal do Pará (UFPA), Campus Marabá, onde hoje é o Campus I da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa). O poeta leciona inglês, português, redação e literatura. Também é repórter, fotógrafo e blogueiro. 
Participou do Concurso de Poesia Professor(a) Poeta(isa) na sua última edição, realizada em 2011, em que alcançou o segundo lugar. E participa ativamente do concurso anual realizado pela Academia de Letras do Sul e Sudeste do Pará (ALSSP), intitulado Prêmio Inglês de Sousa, em que logrou a primeira colocação no gênero poesia, durante a edição do ano 2014.
Atualmente, trabalha no Instituto de Ensino A+, Colégio Universo, Preparatório de Medicina Everest. Além disso, é assessor parlamentar e assina o blog Olhar do Alto (OA).
Até outubro de 2016, Anderson fez parte do coletivo de poetas e artistas do Sarau da Lua Cheia, um evento artístico e cultural fundado em março de 2013, de caráter itinerante, que acontece em Marabá, uma vez por mês, promovendo a leitura, o livro e a divulgação das obras de autores paraenses.
Também foi membro-fundador da Associação de Escritores do Sul e Sudeste do Pará (AESSP), mas dissidiu por discordar da mentalidade esquerdista que passou a dominar a direção da instituição após a queda do governo Dilma Rousseff, que manteve o PT no poder por quase 14 anos.


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