“Oxe! Eu num sou apadrinhado
por políticos ou celebridades pra ganhar a vida fácil”. Esta declaração soa
perigosa. Alguns diriam preconceituosa. Afinal, o Brasil não é uma nação de
aproveitadores mesquinhos. Pois, as conquistas pessoais do cidadão brasileiro
não negam o mérito. E nossas leis respeitam cada vez mais as minorias.
Porém, quantos não são os
jovens educados na cartilha da facilitação? Os pais conhecem alguém que por sua
vez conhece alguém... E o que pensar dos adultos que cultivam isso?
Até que ponto vale a pena
viver num país assim, em que as oportunidades são inconstitucionais? Isto é, elas
discriminam por cor, credo, origem, sexo e idade. Claro que existem pessoas por
trás disso. E como diz o artigo 3º da Constituição Federal, não é legal
“quaisquer outras formas de discriminação”. Nem essa que, se a pessoa não tem
amizade com personalidades famosas, as portas se fecham.
Infelizmente, essa prática
social abriu filiais em cada canto do Brasil. Cidades interioranas, capitais.
Cada uma com seu proporcional absurdo. Eu ia colocar a culpa na TV, mas tudo
indica que esse comportamento é anterior a ela.
Agora, alguém duvida dos
absurdos? Me conte aí, como é que funciona a prefeitura de sua cidade no
primeiro semestre após as eleições? Penso que nem precisa tanto tempo. Nas
cidades mais sofisticadas, basta sair os resultados de vereadores e prefeitos
eleitos.
Não vale nem citar que na
arte também é assim. Os atores mirins, só pra apontar algo corriqueiro, eles
participam de testes. Seleções com filas cheias deles. Estrear em novelas e
comerciais. Os pais roem unhas às escondidas. Aí, pronto acabou. “Num é que o
resultado foi pro filho de fulana, escritora de novelas!”
Mas, é bem fácil contrapor
esse acontecimento com argumentos sólidos. “Filho de peixe, peixinho é. A mãe
desse garoto ensinou desde cedo, poxa!”. Este é o tipo de exame de DNA que
todos gostariam de levar ao Ratinho. Uma pena que não tem resultado.
E entre os jogadores de
futebol? Os cantores, ou apresentadores de TV? Há absurdos? Fico feliz por não
entender metade das falcatruas que venham a acontecer nesses meios. Mas,
sinto-me um infeliz porque meu vizinho não tem as mesmas oportunidades.
É entristecedor falar que
ainda existe tamanha separação numa nação tão diversa. Só que nossa lucidez nos
cobra atitudes. E não se pode tratar como sem fundamento aquelas piadinhas,
tipo, um político estrangeiro chegou e perguntou ao político brasileiro: “Como
vai o Brasil?”, ele responde: “Vai bem, vai muito bem!”. “E o povo, como é que
está?”, nosso representante diz: “Esse vai mal!”.
Você sabe disso. Políticos,
artistas e celebridades usam fama e influência pra favorecer parentes e amigos.
É a famosa oportunidade de cabresto. Enquanto isso, a maioria dos brasileiros
rala feio.
Sem falar que facilitam a
vidas deles com empregos rentáveis, até status, ainda que os favorecidos sejam
profissionais de quinta. Sem mentira nenhuma, eu aceitaria que colocassem um
parente ou amigo gabaritado e comprometido com o povo. Pelo menos estariam
indicando alguém que iria produzir pra si e para os civis igualitariamente.
No país onde a onda do
“politicamente correto” está domando a língua, e o pensamento do povo, pensar
assim é preocupante. Só que há coisa pior gente. Escola e estudo público não
são mais o suficiente pra mudar essa reprodução de injustiças e descaramentos.
Falo isso por causa da injustidade do fator QI. Não adianta na
maioria dos casos os jovens terem passado décadas, indo da escola à
universidade, trabalhando intelecto e suas múltiplas habilidades, pra ter um
bom currículo profissional. Basta chegar uma personalidade pública prestigiada,
ou um líder influente, que indica
alguém e o empregador dá a melhor vaga. Isso faz parte do “jeitinho brasileiro”
que pisa em qualquer escrúpulo.
Anos de estudos que os
jovens brasileiros tem são facilmente encestados no lixo.
O tal do QI é injusto mesmo!
Até porque todo lugar existe aquela gentinha mendigando um favor de um padrinho
influente. Ajudou fulano ali, prestou favores aqui. Agora é hora de colher.
Aliás, isso é lei do cotidiano, não é mesmo? Quem não chora, não mama! Profissionais
de quinta, por favor, me errem.
Vamos emparedar o “jeitinho”.
E essa postura tem de ser uma profissão de fé. Enquanto essa praga do jeitinho,
esse ranço dos infernos, não for pra berlinda e se tornar alvo de nossas
orações mais fervorosas, os brasileirinhos que rebentarão no ventre das mães
hoje padecerão com o cabresto dos privilegiados.