NACIONAL ENERGY

terça-feira, 7 de maio de 2013

PARADOS NA VIDA!


A condição de indigência social é dada a pessoas com base em sua qualidade de vida. Fica mais fácil dizer que elas não tem qualidade nenhuma. Falta sustentação alguma pra viverem descentemente. Sem moradia, privados de alimentação saudável, desempregados, abandonados pela família... e não poucas possuem o quadro de addicts (viciados).
Não vou entrar aqui no “mérito” que a maioria das pessoas dá aos vícios nocivos à saúde física e mental. Afinal, fica muito fácil afirmar que o alcoolismo empobreceu, adoeceu e matou um indivíduo. Ou mesmo, apontar que a prostituição perverteu, enfermou e escravizou uma jovem.
Existem outros absurdos que deviam nos estarrecer. Mas, tem gente interessada que as drogas lícitas e promiscuidade autodegradante não aterrorizem ninguém.
Dizer que fulano foi morto como indigente não choca mais as pessoas. Como que isso é possível? Ninguém nasce das pedras. Faz quase dois séculos que a teoria da abiogênese foi banida. Contudo, os cemitérios representam a linha de chegada de muitos indigentes.
É verdade que os jornais mostram casos piores de indigência social. Todavia, nada se compara com andar em cada bairro da própria cidade e avistar um, outro, outros, muitos e centenas juntos. Todos candidatos àquela linha de chegada.
Gente não dá em árvore. Mas milhares estão apodrecendo no cotidiano de nossas cidades. Bolsões de famílias tentando adiar um pouquinho só a morte.
Mendigos, marginais, molambos são muitos os rótulos. Geralmente essas pessoas ocupam a classe dos miseráveis. E, sem sombra de dúvidas, o fator que determina nessa classificação é a realidade financeira de cada uma delas. Tão normal medir as pessoas pelo bolso que parece ser única balança da vida.
Só que essa é uma maneira muito rasteira de se conceber a vida. Digo, o jeito que enxergamos a indigência social deixa de fora outros fatores. É a partir daqui que todas as pessoas se tornam criminosas. À cumplicidade estampada na nossa cara fizemos o favor de pôr na nuca. Assim, olhando-nos face a face não vemos a pena que nos cabe.
Porém, basta alguém se virar e o dolo ali está. Todos nós olhamos nossos amigos cidadãos pelas costas e nem hesitamos em apontá-los como responsáveis. Julgar e se isentar! Condená-los como culpados. Afinal, ninguém enxerga a própria nuca. E desse jeito sempre vai ser papel dos outros recuperarem os miseráveis.
Sim, são milhares de pessoas submetidas à miserabilidade. Mas, até que ponto elas são responsáveis por tamanha degradação de si próprios?
Nossa sociedade – e vale dizer que não é só a brasileira – herdou um histórico de injustiças contra os mais fracos e indefesos. E olha que estes eram a maioria. O problema é que nem tudo ficou no passado. Ainda existem águas passadas derrubando moinhos feitos de carne e osso de gente.
Há forças e estruturas que pertencem a ideologias que produzem seus próprios pobres amaldiçoados. Fábricas de miseráveis! Que, cedo ou tarde, exterminam. Basta ouvir o papo de dois coveiros, como o fez João Cabral de Melo Neto, e compreender a condição dessa gente. “É a gente dos enterros gratuitos / e dos defuntos ininterruptos”.
Isso tudo não antes de abusá-los, sugar-lhes a última gota de vitalidade capaz de ser convertida em bens materiais – ou qualquer produto enlatado, que resulte em mais do capital que está na mão de nossos líderes políticos e empresários.
As forças de marginalização de certos segmentos sociais não podem ser descartadas. É direito da maioria lutar contra elas. Há reflexos delas em todos e tantos quantos forem os espaços em que as pessoas se relacionam. Nuns mais, noutros menos. O importante é identificarmos o alicerce dessa tendência de marginalização. E daí, partirmos para o contraextermínio.
Há reflexos dentro das famílias, das escolas, das igrejas, das universidades, dos partidos políticos, das empresas, das ONGs... nos bairros, nos bares, nas praças. Em todo lugar, pelo menos a apatia acerca da condição de vida daqueles que padecem privação aumenta. Se prolifera qual virose.
Atualmente, o jornalista Leandro Narloch tem colocado até grandes personalidades da história brasileira – como Luis Carlos Prestes e Zumbi dos Palmares – na coluna não só de apáticos, mas de vilões. E bem contraditórios.
Agora, o que é que mais causa essa asfixia social? Como dizia Victor Hugo ainda no século XIX, é o nosso sistema de leis e práticas sociais contraditórias. Contraditórias porque permitem o assalto aos direitos básicos do ser humano.
Ele dizia que enquanto houver leis e costumes que eliminam certos tipos de pessoas – o que hoje em dia chamamos de segmentos sociais –, forçando em plena civilização a existência de verdadeiros infernos, o destino que deveria ser divino pra essas pessoas nunca será alcançado.
Hugo entendia que eram três os maiores problemas da humanidade. Se resumiam, primeiramente, na degradação do homem pelo proletariado, a prostituição da mulher pela fome, e a atrofia da criança pela ignorância. Se não forem resolvidos, o assalto continuará.
Embora o autor citado sofra críticas por sua visão de mundo, e para os muitos cientistas da sociedade ele não tenha autoridade sobre o século XXI, Theodor Adorno pontua verdades semelhantes. E não menos aterradoras.
Semelhantes porque o start da cultura de massas, que vivemos hoje, se configurou melhor do século XIX pra cá. Tantos avanços de lá pra cá e a miséria não muda.
Adorno concluiu que o mundo inteiro é forçado a passar pela indústria cultural. Isso facilita a maior parte da sociedade pensar na condição dos indigentes como fatalidade, se isentar de responsabilidades, ou pensar qualquer coisa mais absurda. Isso sim é assustador.
Basta os dirigentes de nosso sistema econômico se interessarem por um absurdo. Uma pena que resgatar os molambos e mendigos não seja uma loucura ou absurdo qualquer.
Aterradoras também, porque hoje é mais fácil incutir absurdos. Para Adorno, a TV, o cinema e o rádio não têm mais necessidade de serem considerados arte, pois, na verdade, esses meios só servem para incutir a ideologia capitalista – aquela que não considera absurdo alguém morrer como indigente.
Ele diz que esses meios de comunicação se auto definem como indústrias, e que os rendimentos de seus diretoresgerais tiram qualquer dúvida sobre a necessidade social de seus produtos. Só que o pior não pára ai. Assim como Hugo apontava que as condições de trabalho corroem o ser humano, Adorno observa que o trabalhador, durante seu tempo livre, deve se orientar pela unidade da produção.
Desse modo, para Adorno a tarefa que cabia aos sujeitos foi tomada pela indústria. Que tarefa? Avaliar esse mundo sem que o bolso seja a régua dos homens.
No entanto, a vida de cada homem e mulher está nas embalagens. Infelizmente, os mendigos só catam. Todo o esquema da vida é realizado pela indústria “como um primeiro serviço ao cliente”.
No mundo hoje os samaritanos escassearam. O único bom-mocismo que encontramos se traveste da fome por capital que move os países imperialistas. Enfim, não estão os mendigos parados na vida. Todos nós estamos poucos passos da parada. Nada mais. 

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