POEMA – Sol imune* (Anderson Damasceno)
Quando a gente para pra olhar,
Da janela do passado,
Histórias que nos fizeram
E por um pouco, ou por pouco,
Quase nos mataram,
É só a gente que se vê,
Agora sem espelhos,
E ninguém mais há nesse quadro.
Se você pensa que o seu hoje
Ainda faz parte do que quase te enlouqueceu,
Ou se ainda tem dúvidas de quão profundo
Foi tudo aquilo que te afetou,
E de que nada faz o menor sentido
Quando você enxerga o tempo que já passou,
Talvez seja a prova de que a poeira,
Nos teus sentidos,
Uma parte de ti sujou.
Vai ser, e já está sendo aqui,
Só mais uma das angústias que você passa de trevessa,
Advindas de coisas e de pessoas mil,
Que todo dia,
O próprio vale atravessam.
Quem sabe se você lava essa roupa,
Quem sabe se você decepa,
A parte que em ti sujou...
No lugar que te desespera.
Se cavuca fora de si,
Ou se procura por dentro dos sonhos,
Acordado em amores mil,
Nem da rua esquece o nome.
Veja as cores no peitoril, antes
Pintadas, agora em azinhavre,
Corroídas pelas primaveras.
Corroídas pelas cadelas.
Ela, e tu, o segundo...
Ninguém mais há nesse quadro.
Nas paredes dos campos,
Os perfumes,
Arbos e colorados.
O peito gentil,
Imune,
Com o pé quente colado.
O vento, o “crucifixo”, o pedregume,
O chão frio, e por fim...
Os sonhos descolados.
Na janela, antes ofendida por espelhos,
O sol relume,
Há vozes em alguma capela,
E sou imune a tantas aquelas
E não a estas.
Só aquelas...
Historiando meu ser ainda encartado dum passado,
Pra onde olho,
E encontro esse tempo desabitado,
Esse sol seguindo seu fado.
Esse sol seguindo seu fado.
*Poema do livro “Laís”,
o terceiro da tríade de poesias femininas.
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