AMOR
EM CASCA - EPITALÂMIO
Anderson Damasceno
Encontre a mulher do teu amor e siga em frente.
Pegue as rosas, roube as flores pelo caminho...
Você sabe que todas ficarão lindas do lado dela,
Porque é ela.
Tome-a pela mão, puxe-a para caminhar, escreva teu carinho...
O tempo é o que pouco importa,
O lugar pouco importa qual é,
Ela é quem importa.
Cheire os cabelos uma vez mais
As ondas, onde há cachos e onde cachos não há.
Enterre neles tuas mãos, teus dedos, massageando com as
digitais sob os fios e o crânio,
O crânio todo deste ser.
A vida que não te abraça, que não te colhe, que não te
aquece...
Tem tudo isso nela.
É gratuito e tem fim. É fortuito e nada mais há que valha
assim.
Que interessa se quebrar o punho da rede?
E se for no sofá, nos sofás, a cabeça pendida no fim da
noite,
O silêncio que se escuta apesar do barulho da TV,
Do carro passando na rua...
Você já é mais que a poeira do dia deixando o corpo dela no
banho.
Se é sem cor a escuridão da madrugada, e mesmo assim você a
vê.
Agarre-as com os suspiros, com o fôlego que vem a cada
fração de tempo.
Volte a dormir e escute o ar quente da paixão inflamada –
Que vai ser apagada no sono até o amanhecer.
E que vida é essa?
Que mão é essa que te prende deliciosamente e não te para?
Deixado os dedos na pele, e segure pra nunca mais deixar ir.
Faça doer mesmo que não pareça existir medo algum de te
deixar louco o perder.
Canta pra ela, mesmo que tua voz não preste, e tua harmonia
seja mal rotulada, bem ou mal avaliada.
Os olhos podem revirar, o gracejo pode vir, a piada...
Se lance, viva, mas não se sufoque.
Construa as estradas que você irá andar com ela.
E a fúria dos desencontros?
Morda tua nuca se conseguir, mas não permita que tua mente
te afogue nas amenidades.
A impetuosa paixão, que não aceita ter lugar com a lascívia,
está em esqueleto:
Sustenta teus músculos do peito, liga teus tendões acima das
doenças.
Vá beijá-la! Não sucumbe!
Crave as unhas no amor da tua vida. As mesmas unhas que ela
cuida.
Arranque da face negra todo os anos do desmerecer, da
indignidade.
A crueldade é maior a cada segundo que passa.
Curve-se perto de seus pés, reclinado, e puxe seus dedos.
Estale, um a um,
Passe a outro, e outro, e ao outro pé. Desça a perna ao chão
e erga a seguinte.
Tá em tuas mãos. É com tuas mãos que se faz, mãos que tecem
este tempo, em que se estala um: “Estou aqui.”.
Em que degredo estive?
Fale a ela, espuma e mar por sobre ela, enxarcando cada som
compressivo, ondular, propagado, e endereçado aos tímpanos.
Processe os sinais acústicos da fala que fala, vasculhando imprintings
no cérebro dela, varredurando as funções superiores da mente,
Sons capazes de construir todo o teu rosto de amor na mente
jardinada que ela tem.
A mente jardinada que ela tem te fez flor.
Homem, flor, raiz, minério, sol, seiva, ela...
Cave maxmartinamente que seja, mas cave. Cave
policarpicamente, mas cave.
Ela-flor, enegrecida, mais que bela, maturada, plantada com
os dedos de tuas mãos.
Grite e faça som... estrídulos que se somam
ininterruptamente.
Faça!
Só não aceite o vazio se estabelecer nesse caso de amor que
só agora é e só agora pode ser depois de tantos anos que é.
É audível teu sussurro no ouvido dela dando o boa noite em
despedida – e que não quer mais se despedir.
E se quer seguir assim...
Nessa loucura do sem saber, enlouquecer-se e crescer com e
pelo teste do tempo e do fruto.
Tu e ela são frutas, de sabor que se mastiga, integradas à
vida, no guaraná da Amazônia.
Vem e sonha teu ser junto com ela, para que seja então o Ser
de tudo aquilo que vocês ainda não conseguem mensurar.
Vem com a morte do arrependido.
Vem com a fé pura do convertido.
Segure-a pela mão, a dela espalmada na tua, soltando de vez
quando pra enxugar o suor no cruzamento dos dedos.
Vem com a fé, o filho, a filha, em sonho, em vida.
O ser que sou capaz de amar,
Ela me aguarda dormindo agora, nesta hora em que não estou
com ela.
A vida segue longa nesta madrugada, mas não me para nem me
cancela...
Quero o meu desacordado amor, e sobreviver ao contra-desacordo
do tempo que nos separa.
E há tanta intriga nesse nó.
Desenrole, faça o desenlace, vaqueje seus atrasos, enlace
seus medos, amarre-os, dominados.
Da prisão do curral, saia batendo o pó para receber das mãos
da mulher que você ama o copo d’água.
Em cada passo que você for avançando, lembre-se que cada
passo também está te distanciando exatamente disso que você busca.
Olhe a paixão de forma cruzada, atravessada no peito,
consumindo cada bombeada do sangue dos ventrículos.
Compressivamente, é ela quem te aperta.
E sistolicamente ela é quem te faz jorrar pra vida, teu
sangue oxigenado pela emoção dos dois.
Talvez você não saiba, mas ninguém mais há que te faça
respirar assim novamente.
E ganhe peso na tua busca.
O peso de quem ama é a única base forte em que os pés dela
poderão se sustentar um dia.
A dor dos anos sós, insistidos e esperançados, chorados com
tanto sal e silêncio, travesseirados...
Execute a confissão do teu amor por ela no altar. Se não
for, há de matar por asfixia do amor quem só te há de amar.
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