Recentemente, li esta obra de Mia Couto, escritor moçambicano. Não só por ela, mas por ser professor, escrevi essa reflexão de hoje. |
É uma honra e um privilégio.
E se tem uma parte interessante na literatura é seu poder de alívio, de purificação das paixões. A isto chamamos função catártica. Ou seja, as coisas que acontecem no dia a dia e os nossos sentimentos – quer bons ou ruins, quer confusos ou sem classificação – encontram afinidade na “história de vida” das personagens ou nas palavras dos poetas.
É uma experiência incrível.
Também é incrível, embora pouco comentado, que a catarse não acontece somente entre o leitor e o livro. Ela ocorre quando se escreve.
Foi passando para o papel que muitos homens e mulheres – que hoje ganham o título de escritores – diminuíram um pouco da dor do mundo. Ou louvaram a beleza do mundo.
Cantores, dramaturgos, roteiristas de cinema... todos aliviaram os conflitos que sentiam criando, e sorrindo, chorando, sangrando ou gritando pro papel as palavras que não aguentavam mais.
É uma forma de matar a dor. E não se deixar ser morto por ela.
Vale lembrar que os pintores fizeram o mesmo com cores e formas. Eles sofriam até com o futuro. De alguma forma, seus quadros conseguiam aplacar um pouco dessa angústia.
Mesmo os poetas que fingem um sofrimento, inventam e “fantasiam”, é o sofrimento de algum alguém.
Como disse o filósofo paraense, Benedito Nunes, a catarse é um efeito estético provocado pela arte, cuja influência se estende ao plano moral da vida. Nossos pensamentos, sentimentos e atitudes recebem o efeito que as obras literárias transportam, como se levassem um poder latente que os poetas deram a elas.
É com a dor deles – papel sangrado – que muitos de nós têm satisfação hoje. Quantas historinhas ficcionais não começaram de uma lágrima, que fez a mão ir amar-se do lápis e socorrer-se no papel?
É um fato extraordinário, sem sombra de dúvidas, porque opera uma transformação única nesse processo, em que a dor do outro faz brotar flores no jardim da minha mente e o cheiro delas no meu coração, a esperança.
Precisamos desses artistas para alguma coisa?
“O céu estrelado vale a dor do mundo”. Penso que, não poucas vezes, eu precisei da Adélia Prado falando isso pra mim. Ave, poeta mineira!
Do mesmo modo tenho uma dor. Sinto que é grande minha necessidade de me livrar dela. Escrevê-la. Eu diria: I need some “relief”, mas não como o Tyrion do Game of Thrones. Isto é, não preciso ver ninguém morrer.
Mas, por enquanto, o único lugar que meu padecimento está escrito é no coração.
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